O Novo Código Comercial, além de ser uma polêmica entre juristas, empresários e políticos, se aprovado, pode gerar um prejuízo de R$ 182 bilhões na economia brasileira. É o que aponta estudo feito pela pesquisadora do Insper, Luciana Yeung.
O projeto de lei que cria o novo código deve ser votado no próximo dia 10 na comissão especial da Câmara. Contudo, a principal crítica diz respeito à insegurança jurídica que a criação de uma nova legislação traria, aumentando os litígios, e, consequentemente, os gastos da União e das empresas.
Conforme o estudo da economista, o impacto mínimo dos custos seria de R$ 26 bilhões para os setores privado e público. A título de comparação, o teto do déficit fiscal do governo federal previsto para este ano é de R$ 170 bilhões. Ao mesmo tempo, especialistas e o próprio governo esperam mais uma retração do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano, em torno de 3,2%.
O levantamento de Luciana sinaliza ainda que a nova legislação poderia acarretar em um acréscimo de 15 mil litígios ao ano.
O principal objetivo do PL 1.572/2011 é reunir em um único documento todos os regramentos que regem a atividade comercial – que atualmente estão dispersos no Código Civil e em diversas leis específicas (como a lei de falências, lei das S.A., lei de propriedade industrial, etc.). Para os defensores do código, a unificação geraria uma maior segurança jurídica e simplificaria as relações entre empresários brasileiros.
“Estamos garimpando tudo que trate de relações comerciais e trazendo para dentro do Código. A nossa esperança e desejo é criar um ambiente jurídico mais simples e menos burocrático para os negócios. Acreditamos que o projeto de lei vai facilitar o entendimento por parte dos julgadores”, afirma o deputado federal e presidente da comissão especial que trata do assunto na Câmara, Laércio Oliveira, em entrevista ao DCI.
De acordo com o político, que também é vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), a criação de um Código Comercial é fundamental para proteger o empresário, além de gerar uma maior segurança jurídica nas relações do segmento.
O professor de direito empresarial da Universidade de Araraquara, Fernando Passos, endossa a opinião de Oliveira, da CNC. “É uma vergonha nacional não termos um código que proteja o empresário”, diz.
Essa avaliação, no entanto, é contestada por outros juristas que acreditam que a aprovação do projeto exerceria o efeito oposto. “É uma falsa ideia de simplificação. Para simplificar, de fato, você deveria pegar as leis já existentes, e torná-las mais simples, e não criar mais uma legislação. Ao fazer isso você só acrescenta complexidade”, afirma o professor de direito comercial da Universidade de São Paulo (USP), Carlos Portugal Gouvêa.
O acadêmico diz que “no novo código alguns artigos vão tratar das normas específicas, mas que essas legislações continuariam existindo”. Ele se refere, por exemplo, às leis de falências, das S.A. e de propriedade industrial – dentre outras -, que continuariam valendo, mas submetidas aos princípios do Código Comercial. Segundo ele, isso seria negativo na medida em que as duas legislações poderiam conflitar, o que aumentaria o número de litígios, e, consequentemente, a insegurança jurídica. Além disso, o novo código alteraria “conceitos e normas que já estão consolidados na jurisprudência”.
Com este cenário, um grupo de professores titulares de direito comercial da USP, redigiu no dia 6 de julho uma carta endereçada ao relator-geral da comissão, Paes Landim, na qual também se posicionam contrários a aprovação da PL 1.572/2011.
“Parece haver inquestionável consenso no sentido de que, em épocas de profunda crise política, econômica, social e moral como a que o País atravessa, não se recomenda vir a lume uma nova legislação, que muito provavelmente, poderá trazer mais turbulência do que segurança nas relações jurídicas entre os empresários”, diz o documento.
Gouvêa complementa que ao longo dos anos as práticas comerciais foram se tornando extremamente complexas, e que isso, na prática, impossibilita a criação de um Código Comercial. “Você precisa de leis muito específicas para tratar cada parte da atividade empresarial, e essa lei precisa ser exaustivamente discutida.”
Um dos pontos mais críticos ao documento se refere a necessidade da empresa de obedecer ao conceito de função social, que da forma como foi regido no texto é considerado amplo e genérico. Ainda de acordo com o texto, se provado que a função social não é exercida pela empresa o Ministério Público poderia pedir a anulação do negócio.
Investidor estrangeiro
Outro aspecto que vem gerando polêmica em relação ao texto é relativo ao investidor estrangeiro. “Além dessa maior insegurança, que já desestimularia a entrada de capital externo, o projeto tem previsões específicas que acabam também tendendo a criar barreira para esse investidor”, diz Gouvêa.
Ele cita como exemplo as alterações relacionadas à lei de falências, que preveem uma piora na prioridade do investidor externo nessas operações. “Você criaria uma segmentação entre investidor estrangeiro e investidor brasileiro. Então, por exemplo, se tivessem dois quirografários – que não tem garantia real -, se um deles fosse investidor de uma sociedade estrangeira, ele basicamente estaria em uma categoria inferior ao outro.”
Passos, da Universidade de Araraquara, rebate essa crítica e afirma que isso só ocorreria quando se trata de um crédito não reconhecido pela legislação brasileira. “Quando existirem créditos não reconhecidos eles terão que ficar no final da fila. Mas só nesses casos o investidor estrangeiro não terá prioridade. É uma norma internacional”, afirma.
Por outro lado, o deputado Oliveira comenta que dentro da comissão especial o único ponto que gera alguma discordância entre os políticos diz respeito à participação do cartório no registro mercantil das empresas. Hoje, só se pode fazer o registro da empresa nas juntas comerciais. O projeto de lei prevê, no entanto, que os cartórios também possam fazer esse trabalho. “É um tema delicado”, diz.
Fonte: Fenacon