O Grupo de Câmaras de Direito Público do Tribunal de Justiça, em sua última sessão, admitiu o primeiro Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) no âmbito do Judiciário de Santa Catarina. Trata-se de um instituto previsto no novo Código de Processo Civil, que busca fomentar modelo de jurisdição democrática e participativa e, ainda, buscar a uniformização do entendimento sobre determinado tema.

Neste caso, a matéria de direito objeto da controvérsia diz respeito à necessidade ou não de ser comprovada a carência de recursos financeiros do cidadão que reclama medicamentos ou procedimentos ao Sistema Único de Saúde (SUS). As estatísticas oficiais do TJ, aliás, apontam que o tema da assistência à saúde tem mobilizado o Judiciário catarinense, com mais de 25 mil demandas atualmente em tramitação em 1º e 2º graus de jurisdição. Ao admitir o IRDR, o Tribunal pretende agora ampliar o debate sobre o tema, em busca de solução que garanta tratamento mais isonômico aos jurisdicionados.

As partes podem inclusive participar desse processo, uma vez que o NCPC prevê a possibilidade de realização de audiência pública para discutir a matéria. “O Tribunal de Justiça de Santa Catarina faz história com a admissão do incidente, confirmando seu pioneirismo e exaltando sua preocupação com a excelência da prestação jurisdicional”, comentou o desembargador Ronei Danielli, relator da apelação que deu origem ao incidente, na sessão realizada em 11 de maio. Logo abaixo, em entrevista, o magistrado forneceu outras explicações sobre o funcionamento do IRDR. Acompanhe:

1) Quem suscitou o incidente? O próprio relator identificou a situação ou é decisão colegiada (e votada pelos integrantes da câmara)?

Des. Ronei Danielli: O incidente, para ser instaurado, necessita da autorização do órgão colegiado competente para julgá-lo, no caso o Grupo de Câmaras de Direito Público. A proposta foi do relator do processo, mas o CPC (art. 977) autoriza que referida iniciativa também parta de magistrado de primeiro grau, do Ministério Público, da Defensoria Pública ou das partes.

2) Instaurar o IRDR, na prática, significa sobrestar a avaliação da matéria para aprofundar estudos? Existe um prazo para que isso ocorra?

RD: Sim, com o objetivo de buscar a uniformização do entendimento jurisprudencial. A instauração do IRDR conduz à suspensão dos processos que tratam de idêntica matéria (art. 982, I), ressalvada a apreciação de tutelas de urgência (§ 2º do art. 982). O incidente deve ser julgado no prazo de até um ano (art. 980).

3) O NCPC prevê até audiência pública. Ela, porém, é obrigatória? Quais outros instrumentos podem ser acionados? Palestras com experts?

RD: A realização da audiência pública é uma faculdade (art. 983, § 1º). O que se pretende com o incidente é promover amplo debate sobre a questão controvertida, sendo a audiência pública um dos instrumentos colocados à disposição para coletar as mais abrangentes informações sobre o tema, inclusive com a promoção de palestras para ouvir pessoas com experiência na matéria. O relator poderá, ainda, promover vários atos processuais objetivando instruir o processo com todos os elementos necessários à promoção do amplo debate a respeito da matéria – art. 983.

4) As demais ações/recursos em tramitação na Justiça estadual que versam sobre saúde pública sofrem algum efeito colateral após a admissão do IRDR, ou apenas aquelas que tratam do tema específico da controvérsia (comprovação de pobreza para direitos junto ao SUS)? E qual seria o efeito?

RD: Os efeitos resultantes do IRDR instaurado são restritos à matéria objeto da deliberação. É possível, entretanto, no caso de realização de audiência pública, buscar solução, via construção conjunta, para outros temas conexos.

5) Resolvido o incidente, haverá efeito vinculante futuro para demandas idênticas, tal qual uma súmula?

R: Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e também aos casos futuros sobre a mesma questão (art. 985). Caso não observada a decisão, caberá reclamação ao Tribunal (985, § 1º).

Fonte: TJSC